Por Ana Zavadil
1112M, xilogravura e carburundun, 40cm x 100cm, 2012
A Amazônia abstrata de Diô Viana
A beleza da Amazônia é fonte de inspiração para o artista Diô Viana. Ele escolheu, por meio de suas obras, falar da riqueza da maior floresta tropical do mundo e da necessidade de conservá-la. A diversidade da floresta aparece no requinte do seu trabalho.
Essa análise da obra de Diô Viana é uma tentativa de interpretar o resultado final de seu trabalho através de sua poética. Cattani (2002, p.48) diz que para se estudar a arte contemporânea é preciso “entender o pensamento visual em sua especificidade, com seus elementos próprios e sua lógica própria; analisar a obra em seus aspectos formais, técnicos, temáticos, estilísticos, simultaneamente e suas relações com o contexto histórico-social-cultural no qual está sendo elaborada”.
O artista atualmente tem uma autonomia absoluta sobre o seu fazer. A abordagem pessoal, a invenção artística e o processo de trabalho exigem do expectador uma reflexão para o entendimento de sua “poiética”. Entende-se por “poiética” tudo o que diz respeito à obra, desde a intenção de realizá-la até a sua instauração. A partir da poética podemos analisar o que o artista nos mostra.
O artista está presente no todo das imagens apresentadas. A expressão produzida por tais imagens está na relação indissociável entre forma e conteúdo.
A sua obra nasce do fruto de uma vivência pessoal, a qual se transforma em memória visual, onde a natureza transcende, metamorfoseando-se em pontos e linhas em movimento. O movimento da natureza em curso aparece, também, como um forte apelo visual.
A arte de Diô encanta pelos muitos e repetidos traços. O figurativo dos rios e matas transforma-se num grafismo abstrato. Os trabalhos são de uma harmonia composta de pontilhados, riscos e rasgos. A matéria se acumula e nos remete aos rios, às marés, à vegetação exuberante e até mesmo à pulsação do ar. Como Van Gogh, Diô pinta a água, a terra e o ar. São inúmeros os apelos visuais; as texturas estão em várias direções. A trama gráfica se abre e se fecha criando profundidades e volumes. Ele pinta e desenha o ar e o espaço entre as coisas. Tudo faz parte de uma repetição de gestos e símbolos que através de um movimento circular nos permite viajar através desses caminhos, flutuar dentro das suas texturas.
O mesmo elemento é retomado em diversas obras: a água (Figura 1). Os traços verticais e horizontais, ora se misturam causando um redemoinho, ora nos levam serenamente em uma direção. O nosso olhar se perde em meio a tantos pontos. Mas ao nos distanciarmos, achamos novamente o todo e esse todo é de uma simplicidade única, capaz de transmitir a identidade do artista representante de uma região que luta para se manter viva.
Diô Viana usa como suporte o papel japonês e o reveste com inúmeras camadas de tinta acrílica, óleo em bastão, nanquim, grafite e um material não convencional recorrente em vários de seus trabalhos: o café.
Ao mesmo tempo em que, em determinados trabalhos ele acumula a matéria, em outros ele cava a tinta deixando o papel nu, descoberto. Cria assim uma nova textura que vibra diante do nosso olhar.
A sua trajetória é marcada pela gravura e pela pintura. Podemos constatar as afinidades entre uma e outra técnica nessa mostra.
Diô representa a natureza com tal intensidade que passa todo o seu sentimento e a verdade das suas memórias para as obras. Estas nos tocam profundamente. Para revelar o segredo da natureza, Read (1968, p. 29) recomenda “usar uma linguagem que corresponde à realidade sentida e não às convenções da linguagem [...] há no homem uma força vital, uma energia transformadora que molda toda a percepção na forma de uma realidade visionária ou imaginativa”.
O artista constrói a sua obra usando repertórios visuais da cultura popular com posturas artísticas eruditas. Algumas imagens podem nos remeter à pintura corporal indígena e à pintura em cerâmica.
A natureza nos é revelada através de círculos, retas e milhares de pontos. Podemos sentir por meio das luzes e sombras galhos que se curvam, rios revoltos ou silenciosos, florestas de muitas cores. A sua obra é forte e nos seduz pela sua capacidade de criatividade e invenção, nos ensinando um modo novo de ver as coisas.
* Bacharel em pintura (2002) e em História, Teoria e Crítica de Arte (2004). Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS.
BIBLIOGRAFIA
CATTANI, Icleia. Arte contemporânea: o lugar da pesquisa. In: BRITES, Blanca; TESSLER, Elida. (orgs.). O meio como ponto zero: metodologia da pesquisa em artes plásticas. Porto Alegre: Editora da Universidade, 2000.
DIÔ VIANA, Catálogo de exposição - Galeria Iberê Camargo - Usina do Gasômetro, Secretaria Municipal da Cultura – Porto Alegre/RS, 2005.
READ, Herbert. Arte e Alienação. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1968.
Ana Zavadil